segunda-feira, 29 de março de 2010

Boteco da Cleusa e do Taquinho

Uma esquina feia, com cara de estacionamento. Chão de cimento verde, telhas plásticas sem forro e alambrado separando as mesinhas plásticas da rua. O prognóstico não teria como ser bom pela parte visual, mas algo dizia que aquele boteco valeria uma visita. Talvez as geladeiras sempre indicando temperatura próxima do zero grau, as placas inconstantes de bolinho de bacalhau (petisco que, ao menos em São Paulo, não é qualquer boteco que ousa servir – e avisar) ou a churrasqueira pré-fabricada de onde prometiam-se boas coisas, afinal o tal botequim divide parede com um açougue tradicional de bairro, desses em que você pede um lombo de porco e a peça é cortada na hora, direto do bicho.

O desbravamento de um boteco desses demanda companhia adequada, daquelas em que o conteúdo importa mais que a forma. Requinte e conforto zero; cerveja gelada, porções botequeiras e conversa sobre assuntos mais e menos importantes do mundo eram o objetivo. Convoquei dois irmãos, um de sangue, outro de vida, os dois entre os melhores amigos que alguém pode pedir na vida. Time escalado, lá fomos nós, Testa, Marcos e eu vencer os 300 metros que separam o tal bar do meu prédio.


Chegamos e fomos recebidos pelo seu Taquinho, de Eustáquio, que seria nosso cicerone durante toda a tarde de sábado. Para beber, Original, Serramalte e Bohemia a R$ 5,00, demais cervejas Ambev por R$ 4,00. E para comer? “Hoje tem bolinho de bacalhau, coxinha de camarão, espetinhos de carne, linguiça, frango, coração, e kafta”, listou Taquinho. Começamos pedindo os bolinhos portugueses (R$ 9,00, seis unidades), coxinha de camarão (R$ 4,00 a unidade) e espetinhos de linguiça e coração (R$ 4,00 cada).

Esse boteco é para quem não tem pressa. As coisas demoraram a vir. Mas a explicação para tanto tempo chegou junto com os salgados, sequinhos crocantes, deliciosos. Tudo tinha acabado de ser preparado.

Os bolinhos de bacalhau, de massa leve e com bastante peixe, tomaram forma entre duas colheres, como manda a tradição. A coxinha de camarão, surpresa mais que boa, trouxe uma massa avermelhada, com sabor de pirão bem temperado, moldando bons pedaços do crustáceo.

Dentre os espetinhos, destaque para o de kafta, pedido no decorrer da tarde – carne moída, condimentada, crocante pelo fogo. É o mesmo já utilizado em vários churrascos meus, preparado pela família portuguesa, dona do açougue e da esquina que abriga o bar. Os demais espetinhos, assados corretamente na churrasqueira a carvão, são da Aurora; assim não trouxeram grandes surpresas, mas pelo menos garantiam a procedência, dizendo que os felinos da área podiam andar tranquilos.

Para quem chega com fome, uma pequena vitrine exibia coxinhas de frango e esfirras. Mandamos uma de calabresa (R$ 3,00), com recheio generoso.

Cerveja vai, cerveja vem, uma visita à cozinha. Lá conheci a alma do bar, dona Cleusa. Cozinheira de mão-cheia, preparava salgadinhos para uma festa de criança, coisa que faz sob encomenda. Contou que está ali há seis anos, desde que desalojada, junto com seu Taquinho, da mercearia que tocava havia 14 anos no imóvel em frente. Foi socorrida pela família portuguesa, que lhe cedeu o espaço atual.

Ela improvisou a cozinha e começou tudo de novo, do zero. Além de preparar suas especialidades pro bar, aceita encomendas para festinhas de criança (eram umas 17h quando começou o vai-e-vem de carrões com mamães buscando os salgadinhos) e refeições completas. “É só trazer a louça que levamos tudo pronto. Feijoada, jantar, o que quiser. Fazemos até churrasco, com acompanhamentos”, vendeu seu peixe.

Saindo da cozinha, minha última pergunta: já pedimos isso, isso, isso e isso. O que falta? “Já comeram bolinho de carne seca? Não?! Então prova”, sentenciou Dona Cleusa, enquanto retirava da geladeira as quatro últimas unidades (R$ 4,00 cada uma) feitas para aquele dia. “Não foram congelados”, orgulhou-se. Ora, pois, frite todos...

Minutos mais tarde as delícias da foto chegaram à mesa e ganharam o troféu de melhor do dia. “O do Pirajá é merda perto disso”, exagerou o Testa. “Calma aí, Testa, não é bem assim. Os de lá são bons também”, acalmou Marcos. Mas todos concordaram que realmente esses eram bem melhores, com massa leve, gosto de abóbora sem exagero, seca e crocante (veja como o papel quase não puxou gordura). Recheio de carne-seca suculento, cheio de temperos. Faltava somente um sabor mais forte, rapidamente preenchido por uma dose do molho caseiro de pimenta dedo-de-moça disponível nas mesas. Perfeitos, enfim...

A tarde continuou correndo, as cervejas descendo, a chuva caiu forte. Dona Cleusa ainda mandou como cortesia minikibes e enroladinhos de salsicha que iriam para a festa de algum pequeno. Por sua vez, Taquinho queria abonar duas cervejas como saideira. Não deixamos. Pagamos a conta cheia, pedimos mais duas e fomos embora felizes, certos de termos descoberto um senhor boteco, tocado por um casal que poderia encenar um comercial do nosso midiático governo da série sou brasileiro, não desisto nunca. No caso deles, sem direito a bolsa qualquer-coisa...

“Fabião, não precisa mais me convidar. Agora sou eu que telefonarei dizendo: “estou aqui na esquina, desce aí””, despediu-se o Testa. É só ligar, querido.

Boteco da Cleusa e do Taquinho
Esquina da R. Conde de Irajá com a Vergueiro – Vila Mariana
Durante a semana até as 20h, sábado até 18h, domingo fecha.
Somente cheque e dinheiro.

PS: única ressalva a ser feita é o banheiro. Não dá para levar sua mulher. Mas boteco é boteco...

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Texto de Fábio A. de Mello, vulgo Brô, que proporcionou mais um sábado incrível para esses dois pobres mortais.

Abraços e beijos.

4 comentários:

  1. Ha! ... No pulo !!! Texto de Bloguero enrustido !! Deixa não, Marcão. Deixa não. Põe ele pra fazer o dele.
    Folgaaado, cara... e ainda vem falar de cumida, rapai !!!
    Quer o meu emprestado? É Déirreal!!
    abç pros 3.

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  2. Pimenta, Pra mim, escrever no blog dos outros é que nem emprestar a escova de dente... Mas ele tem crédito. E quem sabe assim ele se anima e cria o dele. Grande abraço pra vcs 3 tb.

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  3. Charlin,
    O cara não emprestou o espaço. Na verdade, foi reembolso por ter saído sem pagar a conta.
    E olha só, não crio meu blog porque a concorrência está desleal... seria tipo Gazeta versus Globo, Folha X Tribuna Ararense...
    E tirando episódios esporádicos como esse, o assunto seria somente fraldas e afins nos próximos meses...
    Abraçopratodos!
    PS: não fica com ciúme, quando rolar de nos encontrarmos, faço um pro PimentaNoz&Óleo

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  4. Marcão, quer dizer que tu eres motociclista??? Aaaaaaaaaaaaahhhhh... Bar do Almeida na veia, então!!
    Lembra daquele bar que eu te falei em frente de casa? Pois é... É de motociclista! O dono já viajou de moto por várias partes do mundo e tem várias fotos pregadas na parede...
    Fica aí o convite pra marcarmos qualquer dia, ok?
    Abraço,
    Sydharta

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